A América Nasceu No Cabo de São Roque

Árvore do Amor (foto disponível em https://natalpraias.com.br/litoral-norte/)

Árvore do Amor (foto disponível em https://natalpraias.com.br/litoral-norte/)

Por Prof. Dr. Lenin Campos Soares e

Guidson Severo do Nascimento

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O Cabo de São Roque tem sua localização em Maxaranguape, no litoral norte potiguar. É um município relativamente pequeno, que até meados de 2010 contava com uma população de pouco mais de 10.442 habitantes, de acordo com o censo do IBGE realizado neste período. Apesar do seu tamanho, anda fazendo muito barulho, juntamente com o município de São Miguel e a sua Praia do Marco, além de Touros por causa de suas reivindicações acerca de ser o primeiro local aonde as frotas portuguesas de Pedro Álvares Cabral teriam aportado no ano de 1500.

Os cabos ou pontas são acidentes geográficos em que uma massa de terra se estende pelo Oceano Atlântico. O de São Roque está localizado a 51 km ao norte da cidade de Natal, e disputa com a Ponta do Seixas, na Paraíba, o título de ponto geográfico mais próximo ao continente africano. A natureza em torno do cabo e da região é composta de dunas, vegetação litorânea e falésias. Um lugar propício para aproveitar a paisagem e esquecer dos problemas do cotidiano. Mas aqui a gente quer saber sobre história né?

Américo Vespúcio

Américo Vespúcio

Quando nos debruçamos sobre o Cabo de São Roque, neste contexto que costumamos classificar como transição da Idade Média a Modernidade, um nome surge: Amerigo Vespucci, ou Américo Vespúcio, navegador, escritor e cartógrafo, nascido em Florença, participou de três viagens à América, terras estas que foi o primeiro a chamar de Novo Mundo, compreendendo que a mesma tinha proporções continentais, de natureza e populações exótica e exuberantes, desbancando as ideias de Cristóvão Colombo, que acreditava ter descoberto apenas algumas ilhas.

No ano de 1501, mais especificamente no mês de maio, sob serviços do então rei D. Manuel I de Portugal, Vespúcio, junto a André Gonçalves, partiu de Lisboa em três naus, com o objetivo de investigar os potenciais econômicos da costa brasileira. Vespúcio, especificamente, deveria nesta sua terceira viagem (agora sobre a tutela portuguesa e não mais espanhola) de construir um mapa da parte sul do continente, que pertenceriam a Portugal, segundo o Tratado de Tordesilhas. No mês de agosto do mesmo ano, terra firme foi avistada. as três naus que chegaram à costa brasileira no dia 7 de agosto de 1501, ancorando os navios diante do lugar hoje chamado Arraial do Marco, situado no vértice da costa do estado do Rio Grande do Norte, distante do Cabo de São Roque, cerca de 45 milhas, segundo descreveu nos seus diários.

 A expedição de mapeamento da costa então começa, de fato, a partir do cabo, em 17 de agosto de 1501. Vespúcio e André Gonçalves se dirigem para o sul do continente, acompanhando o litoral até a Patagônia, registrando cada um dos acidentes geográficos e transformando a geografia de todo mundo. Em outras palavras, é no Cabo de São Roque que nasce o Novo Mundo, isto é, a partir dele que Vespúcio vai perceber que o Brasil seria um outro continente, ainda não conhecido, e não uma extensão das Índias, como imaginava Colombo. Foi nas Bahamas (não sabemos em qual ilha precisamente) que a América foi descoberta, mas é no Cabo de São Roque que ela de fato nasce. Vespúcio é o primeiro a entender que se tratava de um continente, enviando cartas ao rei português que transformaram para sempre a história da humanidade.

As impressões dele acerca das terras brasileiras denunciam muito mais sua cultura e religiosidade do que as formas do relevo que avistavam. Imbricado nos seus olhares e perspectiva ao novo continente estavam as subjetividades eurocêntricas e suas devoções e piedade, basta observar o modo com que fora batizado o nome de diversos locais que passaram a explorar, temos: o Cabo de São Roque, que é batizado a 16 de agosto de 1501; o Cabo de Santo Agostinho, a 28 do mesmo mês; o Rio São Francisco, a 4 de outubro; a Baía de Todos os Santos, a 1 de novembro; o Cabo de São Tomé, a 21 de dezembro; o Rio de Janeiro, a 1 de janeiro de 1502; Angra dos Reis, a 6 de janeiro; São Sebastião, a 20 do mesmo mês; São Vicente a 22 de janeiro e por fim Cananeia, último ponto da costa estabelecido por Vespúcio. Eles expressam bem mais que uma simples descrição de pontos geográficos, vemos a partir daí o olhar de dominação sobre as terras aonde o simples fato de renomear implicava em uma complexa relação de controle do território. Não importava os nomes que os nativos davam a esse espaço, a colonização começa a partir dos nomes cristãos que são impostos à terra. A fé cristã e sua cruz ligam-se no Novo Mundo às batalhas, entraves e remodelamento da cultura nativa, justificando as mais diversas formas de dominação e exploração.

Para Saber Mais:

Lenin Campos Soares. O padre, o filósofo e o profeta: a América de Simão de Vasconcelos.

Luiz Antônio Lindo. A Carta Mundus Novus de Vespucci e a lenda do homem natural de Rousseau.

Luiz Manoel Neves Costa. Mundus Novus, Novus Homo: cartografias do imaginário e do outro no Novo Mundo (séc. XVI-XVII).

Roberto Levillier. Mudus Novus : A carta de Vespúcio que revolucionou a Geografia.