A Visita de Frans Post
Por Prof. Dr. Lenin Campos Soares
Segundo a historiografia clássica do Rio Grande do Norte, autores como Tavares de Lira e Luís da Câmara Cascudo, dizem que o domínio holandês foi péssimo para o desenvolvimento do Brasil. Tavares de Lira, por exemplo, diz que somente a confusão de atos isolados do conde Maurício de Nassau, no Recife, com toda a administração da Companhia das Índias, o que para ele não passava de uma empresa de piratas, explica alguém defender a presença holandesa nas terras coloniais de Portugal. Segundo Lira, é o espírito mercantil que os animava, e não uma defesa da liberdade civil e do progresso contra o Absolutismo. É por isso que Tavares de Lira diz que o que foi instalado tanto em Salvador, quanto no Recife, foi um empório comercial.
Já Câmara Cascudo acredita que de todas as terras dominadas pela a Holanda, o Rio Grande é aquela que mais sofreu e menos teve. Não interessava aos holandeses a população que vivia aqui, nem portuguesa, nem indígena. Nesta época, Natal e seus arredores era uma região dedicada a pecuária, a criação de animais para o abate e produção de carne-de-sol, além das roças de mandioca e do peixe seco, que servia para abastecer a população da capitania de Pernambuco. Diz Joham Nieuhof, em sua Memóravel Viagem Marítima e Terrestre ao Brasil, em 1640, “O Rio Grande era, portanto, a única região de onde se recebiam quantidades ponderáveis de farinha e gado que minoravam e parte a escassez de gêneros reinante no Recife”. Fora esta a fortuna que os holandeses vieram ao Rio Grande obter, ou suas terras ao sul passariam fome. Cascudo reclama, na verdade, que apesar dessa riqueza, a cidade do Natal não recebeu os mesmos investimentos que Recife no governo do Conde Maurício de Nassau.
Este, no entanto, esteve em Natal em janeiro de 1638. Hospedou-se no Castelo Ceulen, que era o antigo Forte dos Reis Magos, com toda a sua comitiva. E o Discurso Sumário que envia como relatório aos Países Baixos descreve a cidade como decaída. Frans Post, que participava de sua comitiva, descreveu a capital como “de aspecto triste e acabrunhador pelas suas ruínas, vestígios da guerra”. Frans Post era um pintor que havia nascido em 1612, morreria em 1680, e que, junto com Albert Eckhout e Georg Marcgraf, participou de uma comitiva artística para pintar as paisagens do Brasil holandês.
Pouco se sabe sobre a vida de Post, somente que ele nascera em Lyeden, sendo o terceiro filho do casal Jan Post, um pintor de vitrais, e Francyntie Peters, e irmão do arquiteto Pieter Post. Dedicava-se a profissão do pai até receber o convite de vir ao Brasil, por indicação do irmão a Nassau. Aqui ele desenvolveu as suas pinturas de paisagens (com o qual permaneceria até o fim de sua vida). A pintura de paisagens, nos Paises Baixos, estava com uma técnica especialmente desenvolvida já no século XVII, derivada das iluminuras medievais. Com ela o pintor era capaz de trazer para quadros de tamanho reduzido e em ilustrações para livros uma riqueza de detalhes que impressiona até hoje. O foco da pintura de gênero é o realismo para as paisagens, que nas iluminuras medievais tendiam a ser representadas de forma abstrata e esquematizada. Sob um olhar que é mais renascentista que medieval, o artista aqui tem como objetivo (e isso é ainda mais forte quando se trata de Post) uma observação exata da paisagem, mantendo uma sobriedade na composição que não se deixa afetar pelo exotismo. Uma característica que vale ressaltar é o uso da luz e das representações das nuvens que, somadas, dão aos céus dos quadros de Franz Post uma interessante ilusão de movimento.
Ele foi bastante profícuo. Pintou mais de cem quadros, quase todos sobre o Brasil holandês, se voltando principalmente para documentar a topografia e a paisagem das terras americanas. Enquanto estava vivendo no Brasil pintou pelo menos dezoito quadros, dos quais apenas sete sobreviveram. Porém, retornando a Holanda, com seus rascunhos em mãos, continuou a produção de pinturas com a temática brasileira, contudo essas obras já são mais afetadas pelo exotismo tropical que as primeiras obras não abraçam. Na verdade, ele descobre um filão de mercado ávido para consumir esse exotismo tropical, então ele produz para satisfazer essa clientela. Um elemento interessante é que a partir de 1960 seus quadros não estão mais associados a paisagens reais do Brasil, ele passa a compor seus quadros rearranjando os elementos pictóricos com que havia trabalhado em outros quadros, criando novas paisagens para atender uma clientela ávida pela a América.
Além disso, ele ilustrou o livro best-seller de Gaspar Barléus, História dos Feitos Recentemente Praticados Durante Oito Anos no Brasil e Noutras Partes sob o Governo de Wesel, Tenente-General de Cavalaria das Províncias-Unidas sob o Príncipe de Orange, de 1647, sobre a história da empreitada batava na América. Um dos livros mais vendidos na Europa no século XVII. O que comprova que as histórias e as imagens sobre a América estavam na moda em todo o Velho Mundo, com uma busca intensa de produtos que contassem ou mostrassem como eram as terras que estavam sendo descobertas do outro lado do Atlântico.
Dos quadros podemos ver:
Como é possível ver, uma característica da pintura de Post é a manutenção de uma linha do horizonte baixa, com o céu e as nuvens ocupando boa parte da tela. Boa parte do quadro é ocupado por esta luz celestial, enquanto outra parte diminuta é ocupada por uma vegetação de cores pesadas e densar, mas não sem meticulosos detalhes, como animais escondidos entre a vegetação e os detalhes das roupas de seus personagens.
Das ilustrações do livro de Gaspar Barléus, podemos ver:
Para Saber Mais:
Enciclopédia Itaú Cultura. Frans Post.
Luís da Câmara Cascudo. História da Cidade do Natal.
Tavares de Lira. História do Rio Grande do Norte.