As Fortalezas do Rio Grande do Norte: Ferreiro Torto e Jenipapo

Por Prof. Dr. Lenin Campos Soares


Ferreiro Torto

Quando nos focamos na casa forte de Ferreiro Torto, ao contrário da casa de pedra de Pium, cuja construção está ligada à colonização do sertão através da penetração pelos caminhos fluviais. Aqui a relação está com a expansão da fronteira colonizada e controlada pelo governo português. No início do século XVII, em 1614, o capitão Francisco Rodrigues Coelho recebeu algumas terras do rei português para construir um engenho de açúcar. O Engenho Potengi, como ele se chamou, foi o segundo engenho do Estado, após Cunhaú, e ganhou esse nome porque estava instalado as margens do rio homônimo. E, como era responsabilidade dos senhores de engenho a construção de uma casa forte, que também serviria de habitação para suas famílias, a casa grande do engenho teria sido uma fortificação. Em torno desta, se formou o terceiro núcleo com mais habitantes da colônia (Cunhaú, depois Natal e, em seguida o Engenho Potengi), por isso, não é surpreendente que os holandeses, após dominarem a capital, tenham se voltado imediatamente para um ataque a casa-forte. E, além de ser uma importante região habitada, ela possuía um porto que dava acesso direto a Nova Amsterdã. Para proteger a nova cidade, era preciso tomar Ferreiro Torto.

Em 1630, o Engenho começa a receber refugiados vindos de Cunhaú, de Natal, além de moradores das fazendas ao redor que também se aproximaram para proteger-se atrás das grossas paredes da casa grande. Na casa-forte, por exemplo, se abrigou o provedor da fazenda real, Pero Vaz Pinto, que na ausência do capitão-mor, morto na batalha, era a maior autoridade da colônia. Os invasores chegaram liderados por Domingos Fernandes Calabar (ou Cloppenburch), com dois capitães chamados Felior e Uxeel, e auxiliados por trezentos janduís armados de arcos e tacapes. As crônicas registram o massacre de 60 pessoas pelas forças holandesas.

Uma carta escrita por Lopo Curado Garro, conta que os soldados chegaram pelo rio. Aportaram num local chamado de Passagem, a três léguas do engenho, e já aí mataram alguns homens que pescavam e aprisionaram um ancião. Daí se dirigiram ao engenho. Numa passagem fechada pela floresta foram surpreendidos pelos homens de Francisco Coelho, perdendo cinco soldados holandeses, mas os atacantes fugiram. Os invasores, no entanto, se perderam na trilha e com a água subindo no mangue, precisaram retornar e montar acampamento. Tentou-se interrogar o velho ancião capturado, porém este deu apenas informações confusas e imprecisas sobre os habitantes e as defesas de Ferreiro Torto.

No dia seguinte, os holandeses atacaram a casa-forte. Os primeiros a atacar foram os janduís, incitados pelo major. Uma onda, precedida de gritos ferozes, se bateu contra as paredes da fortificação, esmagando os refugiados. Para a maioria dos historiadores clássicos norte-riograndenses não foi necessária nenhuma atuação dos soldados holandeses, os nativos teriam eliminados a todos sozinhos. Morreram aí Francisco Coelho, sua esposa, e seus cinco filhos. A casa-forte é então tomada e controlada pelos invasores.

Após a expulsão dos holandeses, o engenho retoma as suas atividades de produção de farinha e açúcar, e mantém sua casa forte até 1845, quando ele é dado como herança ao coronel Estevão José Barbosa de Moura, vice-presidente da província, que manda demolir a fortificação. Ele constrói no lugar um casarão, com dois pavimentos e dez quartos, provido de água encanada, banheiros e vidraças trazidas da Europa, tinha também uma capela e era cercado por jardins franceses, tendo um pelourinho numa praça lajeada. O prédio é concluído em 1847 e a única coisa que mantém da antiga casa-forte é a existência de túnel que a liga até o porto, para uma necessidade de fuga (apesar do túnel não ser construção original da casa forte, foi acrescentada pelo coronel Joaquim José do Rego Barros, em 1817). O novo solar, de beirais arrematados com frisos e cornijas, se torna a casa de veraneio do coronel Estevão e sua família até que com o falecimento do coronel, o engenho coube no espólio a sua filha mais nova, Isabel Cândida de Moura, casada com o Dr. Francisco Clementino de Vasconcelos Chaves, sendo a casa onde nasceu o Dr. João Chaves, importante criminalista potiguar, em 1875.

“o nome Ferreiro Torto, dizem, era por causa de um coqueiro muito alto e torto que existia bem próximo à porteira da fazenda; quase embaixo dessa árvore, um ferreiro havia montado a sua tenda e oferecia seus serviços aos tropeiros que por ali passavam” (SOUZA, O Giramundo).

Sobre o porto, ele continuou navegável e sendo utilizado até pelo menos 1920, quando o engenho deixa a família Moura, sendo comprado por um segundo chamado Francisco Coelho, que transferiu para Bruno Pereira, e na década seguinte vendeu para Amélia Duarte Machado. Pois é, o último proprietário de Ferreiro Torto foi a Viúva Machado, que o comprou em 1930. O solar ficou abandonado até 1977, quando, em ruínas, foi desapropriado e restaurado pela prefeitura de Macaíba, Emproturn, Fundação José Augusto e o IPHAN. Aberto como museu, tornou-se entre 1983 e 1989, sede da prefeitura, em 1994 retornou a ser um museu e zona de proteção da floresta atlântica (com seis hectares preservados).


Fotos Acervo do Natal das Antigas.

Fortim do Jenipapo

Estava localizado na barra do rio Ceará-Mirim e é, provavelmente, a fortaleza que temos menos informações na literatura especializada sobre o assunto. Annibal Baretto, em seu Fortificações do Brasil, é um dos poucos a mencionar esta equipamento militar, por exemplo.