Alecrim: A Cidade Operária
Por Profa. Jeanne Araújo
A primeira mudança urbana proposta para a cidade de Natal foi chamada de plano Polidrelli, que relacionado com o sentimentalismo republicano (a república tinha acabado de ser instalada), propiciou uma reconstrução da cidade. Diversas reformas ocorreram na cidade, cujo objetivo era apagar a memória colonial e imperial. Se abriram novas ruas, reformas de calçadas e muros, se instalaram melhoria no sistema de iluminação (com a introdução da energia elétrica), transporte (com a introdução dos bondes) e comunicação (com a instalação do telégrafo). Porém a principal mudança foi a construção de um novo bairro que foi chamado de Cidade Nova (hoje Petrópolis e Tirol), por volta de 1901. Este novo bairro era caracterizado pelas suas ruas retas e posicionadas para permitir que o vento corresse entre as casas, ao contrário dos bairros antigos, com as casas coladas umas as outras, o que na época se acreditava que era a principal causa de epidemias e doenças.
Porém a cidade continuou a crescer. Entre 1900 e 1920, Natal saltou de 16.056 para 30.696 habitantes. Eram especialmente migrantes que vieram do sertão. Gente que a elite natalense não queria habitando a sua Cidade Nova, então era preciso replanejar a cidade e é nesse momento que Giácomo Palumbo e Omar O’Grady entram.
Giácomo Palumbo foi um arquiteto grego, formado na École de Beaux-Arts em Paris, que projetou um plano de reformulação da cidade de Natal, iniciado em 1929 e ficando pronto em 1930, recebeu o nome de Plano Geral de Sistematização de Natal. Giácomo Palumbo chegou ao Brasil no ano de 1918 e antes de sua chegada ao Rio Grande do Norte, morou inicialmente em Pernambuco e na Paraíba, lugares que deixou outras construções, entre elas, um dos cartões postais da cidade do Recife, a ponte Duarte Coelho. No período, foi convidado pelo prefeito Omar O´Grady (que cursou Engenharia Civil pelo então Armour Institute of Technology – AIT), durante a sua segunda gestão, para realizar um novo plano urbanístico para a cidade. Um engenheiro com formação nos Estados Unidos e um arquiteto com formação em Paris estariam unidos no planejamento urbano da cidade.
O plano Palumbo, como ficou conhecido, tinha o objetivo de criar uma cidade moderna e funcional, que respirasse o futuro e deveria definir funções para os bairros existentes na cidade, dando prosseguimento ao que foi elaborado para a Cidade Nova com o Plano Polidrelli, expandindo o traçado poligonal usado no planejamento do bairro Cidade Nova e usando o zoneamento como estratégia de controle do espaço urbano, dividindo a cidade em bairro comercial, residencial, jardim e operário, também projetando o porto fluvial e o aeroporto da cidade. Pretendia controlar a expansão da cidade de maneira mais organizada, abrangendo uma área que ia desde a Fortaleza dos Reis Magos até a rua Jundiaí.
Como todo projeto urbanístico, a própria administração da Cidade de Natal precisou sofrer uma série de modificações, a divisão da cidade em zonas foi uma delas, o bairro de Cidade Nova (Petrópolis e Tirol) se tornaram residenciais; a Ribeira era comercial e o Alecrim, que era o bairro mais novo, tornou-se o bairro operário. Isso, a prática, significava que a elite, os homens ricos da cidade, estavam autorizados a viver em Petrópolis e Tirol, enquanto as pessoas mais pobres estavam autorizadas a viver apenas no Alecrim. A separação social era a tônica também deste projeto.
O plano abrangia a reformulação no sistema de transporte automobilístico, com o intuito de melhorar o trânsito entre os bairros de Cidade Alta e Ribeira. O tráfego de indivíduos e transportes deveria ser livre de qualquer congestionamento. Também se propôs a criação de um grande parque central (que não saiu do papel). Foram de fatos realizado o prolongamento da Avenida Deodoro da Fonseca avançando até o Alecrim, a construção da primeira maternidade de Natal (que mais tarde se tornaria a Januário Cicco), a arborização das vias da cidade, a conclusão das obras no porto de Natal e a construção, no Alecrim, das vilas e do hospital operário.
Contudo, todo o plano não pôde ser concluída completamente, pois exigiam grandes mudanças na estrutura física da cidade e uma intervenção maior do poder público, levando a retirada do poder os idealizadores do projeto. Foi proposta uma comissão para executar o plano, para que ele não sofresse interferências quando houvesse trocas de governos, contudo isso não aconteceu, e o Plano Geral não foi aplicado por completo, especialmente porque o Movimento de 1930 implicou no afastamento de O’Grady da prefeitura do munícipio.
Embora não tenha sido implantado na íntegra, a análise do Plano Geral de Sistematização de Natal é essencial para a compreensão de um período específico do urbanismo natalense, quando a administração da cidade sistematizou as reformas realizadas durante a década de 1920 e deu andamento a um planejamento que guiaria as transformações futuras. O Plano de 1929-1930 expressou, pois, um ideal de cidade, a concretização da modernização de Natal, que continuava sendo processada de forma segregacionista.
Para saber mais:
Ângela Ferreira e George Dantas. O plano Palumbo preparando a Natal do futuro.