História da Arte Potiguar: Art Nouveau
Por Prof. Dr. Lenin Campos Soares e
Prof. Matheus Barbosa
Art Nouveau, ou melhor, “Arte Nova” é um modelo artístico que tem origem na Bélgica, no fim do século XIX. Sua existência está ligada ao contexto conhecido como Belle Époque (1871-1914), um momento histórico em que vários avanços tecnológicos e econômicos ocorreram na Europa, causando grandes mudanças comportamentais dos indivíduos em várias cidades pelo mundo, durante a Belle Époque os lemas positivistas de “ordem e progresso” eram invocados constantemente, se acreditava realmente que a humanidade caminhava uma trilha de constante crescimento e evolução, porém, todo este sentimento se encerrou com a explosão da Primeira Guerra Mundial. Quando a guerra começou, a ideia de que a humanidade caminhava para um futuro melhor caiu por terra.
Neste sentimento de evolução, se buscou um estilo artístico que refletisse as inovações tecnológicas da sociedade industrial. Sua primeira manifestação é o rompimento com o Academicismo, isto é, com tudo aquilo que estava sendo produzido nas Academias de Belas Artes, cujo foco maior era o Historicismo, a inspiração no passado (lembrando que neste momento o Eclético, que trazia de volta tudo que já tinha sido usado por estilos anteriores era a atual moda), tudo agora precisava ser novo, tudo agora precisava ser original. Porém com suas referências a vegetação, flores e folhagens, alguns historiadores fazem uma conexão com outro movimento francês chamado Rococó. Outros fazem relação com o Romantismo, em especial por causa da conexão com o Positivismo e a idealização da máquina, da indústria e a sua conexão com o progresso. Então, apesar de seu foco com o rompimento com a tradição, a própria Arte Nova não conseguiu se desvencilhar completamente do passado.
“O design e a arquitetura Art Nouveau caracterizavam-se por enfatizar a linha ondulante, figurativa, abstrata ou geométrica, tratada com ousadia e simplicidade” (SOUZE e PISSETTI, 2011). E graças a produção industrial, elementos decorativos começaram a ser fabricados em série, constituindo artigos de catálogo, que podiam ser escolhidos por imagens, encomendados, e depois colados nas paredes. Elementos de metal, que precisariam ser esculpidos individualmente, eram agora produzidos em larga escala. Novos materiais como o vidro e o plástico, e novas técnicas como a pátina e a marchetaria também são típicos desse período.
Outro ponto importante desta nova arte é a ascensão do individualismo artístico, do estilo individual de cada artista. Enquanto a produção em massa mantinha toda a produção igual, em oposição os artistas que se mantém (boa parte dos artífices, na verdade, perdem seus empregos e são obrigados a ingressar na massa operária) passam a significar uma marca. Seus nomes, sua obras assinadas, são agora objeto de desejo da elite burguesa, elemento de diferenciação social já que qualquer um poderia ter as louças, os moveis ou luminárias agora produzidas agora em massa.
Uma outra característica importante do estilo Art Nouveau é seu foco não no prédio, em suas questões arquitetônicas, mas na sua decoração. A Art Nouveau tem um olhar mais apurado para os móveis, para os tapetes, para os vasos de flores, para os elementos que tem apenas valor decorativo. Por isso ele também avançara a moda, em especial a joalheria. E, neste caso, os novos artistas da época eram influenciados pelas mudanças sociais como, por exemplo, a autonomia feminina. “Sentindo o amanhecer de uma nova era, as mulheres rejeitaram modas e acessórios do século XIX e procuraram a modernidade, e isso significou a Art Nouveau, especialmente as joias originais de Lalique, com sua eroticidade e pedras decadentes” (BEDOYERE e JUROS, 2005).
O estilo artistico chega no Brasil ainda no inicio da Republica, juntamente com as ideias positivistas de progresso e modernidade, cidades como São Paulo, em especial, no auge do desenvolvimento econômico trazido pelo café, se reconstrói a cidade. No caso do Rio Grande do Norte, no início do período republicano, a Ribeira era o principal bairro comercial da cidade, e é por onde a modernidade entra em Natal.
Nosso maior monumento Art Nouveau no Rio Grande do Norte é, sem sombra de dúvida, o Teatro Alberto Maranhão. Construído em 1904 com o nome de Carlos Gomes ( uma homenagem a um compositor de opera brasileiro, posteriormente em 1957 é que o Teatro recebe o nome de Alberto Maranhão, em homenagem ao ex-governador do Rio Grande Do Norte), e tendo uma grande reforma, idealizada por Herculano Ramos em 1910, ele trouxe todos os elementos da arte nova em sua fachada. Seus gradis e portões, os cálices, vasos com flores, a estátua, as medalhas e atlantes, tudo fora importado da França e chegaram já prontos para serem instalados. A decoração da fachada explora traços simples, discretos, porque aquilo que foi feito pela mão humana não deve competir com aquilo que fora feito mecanicamente. O maravilhoso advinha destas “modernidades”.
No teatro, tanto na parte exterior como na interior podemos perceber elementos claros de Art Nouveau, logo em sua entrada podemos ver a utilização do ferro, com o cuidadoso detalhe assimétrico, e também a utilização de curvas nos portões de entrada, e os traços ondulatórios podem ser vistos claramente na parte superior, acima da fachada onde está o nome do teatro. No seu interior, as colunas de sustentação e as proteções dos assentos na parte superior são feitos também de ferro, sendo utilizados elementos assimétricos. No fim da década de 80, o teatro recebeu uma reforma e uma restauração, sendo o teatro mais antigo do nosso Estado, e pela sua grande importância para a nossa cultura, o teatro é oficializado como Patrimônio Histórico e Artístico do Rio Grande do Norte.
Outros prédios no entorno da Praça Augusto Severo também mantinham esta estética Art Nouveu, porém grande parte deles não sobreviveu ao teste do tempo. A Loja Paris em Natal, que ficava no extremo oposto ao teatro era uma delas. Sua fachada possuía quatro grandes janelas no piso superior e estas possuíam guarda-corpos trazidos da França. Sobre as portas, o tímpano dos arcos, também exibia trabalhos em metal de oficinas francesas. A loja abriu em 1908 e vendia artigos finos para a população potiguar. Ao lado, ficava o Cine Polytheama, que abriu suas portas na praça Augusto Severo em 1915. Ele possuía elementos ecléticos em sua fachada, como a balustrada que coroava o teto e o frontão, como a decoração floral em todas as portas, porém também os tímpanos das portas haviam sido importados.
Um dos únicos prédios a resistirem ao tempo neste conjunto arquitetônico é a Junta Comercial, localizada na esquina com a Av. Duque de Caxias. O prédio é, na verdade, uma junção do Art Nouveau e do Art Decó, já que é um dos mais recentes, sendo construído em 1930. A diferença entre um e outro é que o Art Decó faz uma decoração das fachadas muito mais intensa, porém as aplicações em metal nas janelas do térreo e no portão de entrada, com elementos orgânicos, folhagens e flores indica claramente a que estilo fazem parte. O prédio, contudo, ainda tem janelas em arco duplo, ladeadas por colunas decorativas com capitéis que imitam guirlandas de flores. Sobre a entrada principal, existe ainda um balcão cujos fustes são ricamente decorados, também com elementos vegetais.
Pela Ribeira, ainda, duas ruas merecem destaque com prédios em estilo Art Nouveau. A Rua Chile, dos seus 83 prédios, temos sete deste estilo (temos 17 Art Decó e 6 ecléticos). Já na Rua Dr. Barata, temos 67 prédios e deles temos apenas um Art Nouveau (4 Decó, 2 ecléticos). Não há nenhum prédio Art Nouveau na Frei Miguelinho que possui 67 prédios, sendo dois ecléticos e oito Art Decó. Como em, sua maioria, são prédios particulares não existe tanta riqueza no trabalho, mas o elementos estão presentes. Como o galpão no número 66, da Rua Chile, cujos tímpanos das portas tem um trabalho em metal que imita os caros gradis franceses. Na imitação, apenas volutas e raios são feitos pelo artífice que não tinha condições de imitar o que as maquinas francesas realizavam. A mesma imitação aparece no número 116, nos tímpanos de janelas e portas também. É exatamente o mesmo estilo, indicando que provavelmente fora o mesmo artesão que realizou o trabalho. No número 184, o trabalho em metal nos tímpanos ganha setas, o mesmo estilo que aparece nas portas e janelas do número 203. Contudo o prédio 203, possui três estilos de tímpanos diferentes, um que combina com o número 184, outro que é somente dele, no qual as setas se invertem, na entrada principal, e um terceiro que combina com o que existe no prédio 209, que pode ser chamado de padrão cauda de pavão. O estilo com setas e volutas reaparece no número 217 e no 241. É provavelmente um mesmo artesão que realiza todos estes trabalhos.
Na Rua Dr. Barata menos prédios neste estilo encontramos. Temos uma antiga papelaria, que vendia lápis, cadernos e material de pintura, que seu primeiro andar mantém os guarda-corpos das quatro janelas superiores feitos em ferro fundido. Os arabescos são detalhados e foram o desenho floral que é tão caro a Arte Nova.
Para Saber Mais:
Carla Souza e Rodrigo Pissetti. Art Decó e Art Nouveau: confluências
Edja Trigueiro. Conhecendo a arquitetura moderna potiguar: um esforço conjunto.
Maurício Silva. Vestígios da estética Art Nouveau no Brasil Pré-modernista.
Miriam Vieira. O lugar da natureza no movimento Art Nouveau.